SI MIS MANOS PUDIERAN DESHOJAR



hands
Mina Anguelova - aqui



Yo pronuncio tu nombre
En las noches oscuras
Cuando vienen los astros
A beber en la luna
Y duermen los ramajes
De las frondas ocultas.
Y yo me siento hueco
De pasión y de música.
Loco reloj que canta
Muertas horas antiguas.

Yo pronuncio tu nombre,
En esta noche oscura,
Y tu nombre me suena
Más lejano que nunca.
Más lejano que todas las estrellas
Y más doliente que la mansa lluvia.

¿Te querré como entonces
Alguna vez? ¿Qué culpa
Tiene mi corazón?
Si la niebla se esfuma
¿Qué otra pasión me espera?
¿Será tranquila y pura?
¡¡Si mis dedos pudieran
Deshojar a la luna!!


Federico Garcia Lorca, Libro de Poemas


Mina, aquele abração :=)






LA SPERANZA



F.T. – 23-1-2006



            (sul torrente notturno)


    Per l’amor dei poeti
    Principessa dei sogni segreti
    Nell’ali dei vivi pensieri ripeti ripeti
    Principessa i tuoi canti:
    O tu chiomata di muti canti
    Pallido amor degli erranti
    Soffoca gli inestinti pianti
    Da trégua agli amori segreti
    Chi le taciturne porte
    Guarda che la Notte
    Ha aperte sull’infinito ?
    Chinan l’ore : col sogno vanito
    China la pallida Sorte ........
    ..................................

    Per l’amor dei poeti, porte
    Aperte de la morte
    Su l’infinito !
    Per l’amor dei poeti
    Principessa il mio sogno vanito
    Nei gorghi de la Sorte


    Dino Campana, Canti orfici




            A ESPERANÇA


                  Pelo amor dos poetas
            Princesa dos sonhos secretos
            Nas asas dos vivos pensamentos repete repete
            Princesa os teus cantos:
            Ó tu frondosa de mudos cantos
            Pálido amor dos errantes
            Sufoca os inextintos prantos
            Dá trégua aos amores secretos:
            Quem as taciturnas portas
            Olha que a Noite
            Abre ao infinito?
            Declinam as horas: com o sonho esvaído
            Declina a pálida Sorte
            ..................................

            Pelo amor dos poetas, portas
            Abertas da morte
            Sobre o infinito!
            Pelo amor dos poetas
            Princesa o meu sonho esvaído
            Nos vórtices da Sorte!


            Dino Campana, in Mesa de Amigos
            Versão de Pedro da Silveira






Mon coeur est ardent, comme brûlant, mon soleil



Moussa Gueye
Moussa Gueye



Mon coeur est ardent, comme brûlant, mon soleil.
Grand aussi mon coeur, comme l'Afrique mon grand coeur.
Habitée d'un grand coeur, mais ne pouvoir aimer...
Aimer toute la terre, aimer tous ses fils.
Etre femme, mais ne pouvoir créer;
Créer, non seulement procréer.

Et femme africaine, lutter.
Encore lutter, pour s'élever plutôt.
Lutter pour effacer l'empreinte de la botte qui écrase.
Seigneur!... lutter
Contre les interdits, préjugés, leur poids.
Lutter encore, toujours, contre soi, contre tout.

Et pourtant!...
Rester Femme africaine, mais gagner l'autre.
Créer, non seulement procréer.
Assumer son destin dans le destin du monde


Ndèye Coumba Mbengue Diakhaté, Filles du Soleil


Abraço apertadinho, G. Ndecky






TREZE VERSOS



F.T. 23-1-2006




    E finalmente pronunciaste a palavra
    não como quem se ajoelha,
    mas como quem escapa da prisão
    e vê o sagrado dossel das bétulas
    através do arco-íris do pranto involuntário.
    E à tua volta cantou o silêncio
    e um sol muito puro clareou a escuridão
    e o mundo por um instante transformou-se
    e estranhamente mudou o sabor do vinho.
    E até eu, que fora destinada
    da palavra divina a ser a assassina,
    calei-me, quase com devoção,
    para poder prolongar esse instante abençoado.


    Anna Akhmátova, Poesia: 1912-1964
    Trad.:Lauro Machado Coelho







Quis ver o rosto do nada



Lisboa. 11-1-2006



      Quis ver o rosto do nada
      quando olhei
      para ver quem me seguia
      ou seguiria
      enquanto não olhasse
      a sombra indecifrada
      desta não sei se selva
      ou estrada
      ou talvez praia
      ou destino perdido no caminho.


      Helder Macedo, Viagem de Inverno







Quando, Lídia, vier o nosso Outono



Autumn Landscape with four Trees
Vincent Van Gogh



        Quando, Lídia, vier o nosso Outono
        Com o Inverno que há nele, reservemos
        Um pensamento, não para a futura
                  Primavera, que é de outrem,
        Nem para o estio, de quem somos mortos,
        Senão para o que fica do que passa –
        O amarelo actual que as folhas vivem
                  E as torna diferentes.


        Ricardo Reis



-Houve o poema dito-
  in Ao Longe os Barcos de Flores
  Poesia Portuguesa do Século XX







Na formosura, prepara o banho, Lídia



Na formosura, prepara o banho, Lídia.Venus Rising from the Sea-Sir Edward Coley Burne-Jones, Bt ARA (1833-1898)
Os anos murcham e só no corpo sentes
Quente e fagueira a passagem da vida.

Não digas, céptica, que a carne é vã e passa
Desfeita em sombra, o negro rio. O Orco
Perséfone raptou rendido à graça.
Talvez no além precises do teu corpo.

Estima-o; e à beleza mais demora
Darão os fados na vida passageira.
Tépida a água, rescenda a musgo e a rosa.
De Paros seja o mármore da banheira.

Nua e rosada imerge na carícia
Emoliente da água perfumada,
E as folhas lassas dos membros espreguiça
Como uma humanizada flor aquática.

Não te esqueças, porém de no amavio
Da água verter um brando óleo de malvas
Que te aveluda as coxas e mais brilho
Te dá ao polimento das espáduas.

E saindo do banho como a deusa
Sai, das macias ondas, nacarada,
Ergue-te para o amor, estátua de seda
Toda coberta com pérolas de água.

Por fim veste a camisa picante;
Com pó de ouro empoa o teu cabelo.
E vai para a alcova onde o teu amante
Te espera radioso e fiel como um espelho.


Natália Correia, O Sol nas Noites e o Luar nos Dias II







Não creias, Lídia que nenhum estio



dance of hours
Gaetano Previati



                                Não creias, Lídia que nenhum estio
                                Por nós perdido possa regressar
                                            Oferecendo a flor
                                            Que adiámos colher.

                                Cada dia te é dado uma só vez
                                E no redondo círculo da noite
                                            Não existe piedade
                                            Para aquele que hesita.

                                Mais tarde será tarde e já é tarde.
                                O tempo apaga tudo menos esse
                                            Longo indelével rasto
                                            Que o não vivido deixa.

                                Não creias na demora em que te medes.
                                Jamais se detém Kronos cujo passo
                                            Vai sempre mais à frente
                                            Do que o teu próprio passo.


                                Sophia de Mello Breyner Andresen, Antologia








COMPARTIMENTOS



fractal




          Arrumada a fala
          na boca, a nudez
          no corpo, a surpresa
          nos olhos, o mármore
          nos ossos, a chuva
          nos gestos, o ácido
          nos dentes, a fome
          no sexo, a fúria
          no estômago, o vento
          nas palavras


          Joaquim Pessoa, Peixe Náufrago







Buganvília :


C.C. – 12-1



coágulo
de sangue
e maravilha.

Albano Martins, Inconcretos Domínios







Vem, Noite



Lisboa. Dezembro de 2005




Vem, Noite antiquíssima e idêntica.
Noite Rainha nascida destronada,
Noite igual por dentro ao silêncio, Noite
Com as estrelas lantejoulas rápidas
No teu vestido franjado de Infinito.

Vem, vagamente,
Vem, levemente,
Vem sozinha, solene, com as mãos caídas
Ao teu lado, vem
E traz os montes longínquos para o pé das árvores próximas,
Funde num campo teu todos os campos que vejo,
Faz da montanha um bloco só do teu corpo,
Apaga-lhe todas as diferenças que de longe vejo,
Todas as estradas que a sobem,
Todas as várias árvores que a fazem verde-escuro ao longe,
Todas as casas brancas e com fumo entre as árvores,
E deixa só uma luz e outra luz e mais outra,
Na distância imprecisa e vagamente perturbadora,
Na distância subitamente impossível de percorrer.

Nossa Senhora
Das coisas impossíveis que procuramos em vão,
[…]

Vem soleníssima,
Soleníssima e cheia
De uma oculta vontade de soluçar,
Talvez porque a alma é grande e a vida pequena,
E todos os gestos não saem do nosso corpo,
E só alcançamos onde o nosso braço chega,
E só vemos até onde chega o nosso olhar.

Vem, dolorosa,
Mater-Dolorosa das Angústias dos Tímidos,
Turris-Eburnea das Tristezas dos Desprezados.
Mão fresca sobre a testa em febre dos Humildes.
Sabor de água sobre os lábios secos dos Cansados.
Vem, lá do fundo
Do horizonte lívido,
Vem e arranca-me
Do solo de angústia e de inutilidade
Onde vicejo.
Apanha-me do meu solo, malmequer esquecido,
Folha a folha lê em mim não sei que sina
E desfolha-me para teu agrado,
Para teu agrado silencioso e fresco.
[…]

Vem sobre os mares,
Sobre os mares maiores,
Sobre os mares sem horizontes precisos,
Vem e passa a mão pelo dorso da fera,
E acalma-o misteriosamente,
Ó domadora hipnótica das coisas que se agitam muito!

Vem, cuidadosa,
Vem, maternal,
Pé ante pé enfermeira antiquíssima, que te sentaste
À cabeceira dos deuses das fés já perdidas,
E que viste nascer Jeová e Júpiter,
E sorriste porque tudo te é falso e inútil.

Vem, Noite silenciosa e extática,
Vem envolver na noite manto branco
O meu coração...
Serenamente como uma brisa na tarde leve,
Tranquilamente com um gesto materno afagando.
Com as estrelas luzindo nas tuas mãos
E a lua máscara misteriosa sobre a tua face.
Todos os sons soam de outra maneira
Quando tu vens.
Quando tu entras baixam todas as vozes,
Ninguém te vê entrar.
Ninguém sabe quando entraste,
Senão de repente, vendo que tudo se recolhe,
Que tudo perde as arestas e as cores,
E que no alto céu ainda claramente azul
Já crescente nítido, ou círculo branco, ou mera luz nova que vem,

A lua começa a ser real.


Álvaro de Campos, Poemas



- Esteve aqui:

Voz: Paulo Autran-







DE AMOR



Fonte Luminosa.Lisboa.12-1-2006



Considera o amor como um retoque num quadro antigo,
que subitamente o vem iluminar:
vimo-nos muitas vezes antes de seres no meu olhar
aquela luz em um país perdido
que tu quiseste em vão esconder, negar.

O quadro manteve o mesmo fulgor:
a reverberação no silêncio da perda,
o desamor.

Quem avivou o brilho das tintas, quem corrigiu o baço
sinal da morte? Falámos de uma dor
num fundo esbatido. Falámos do grito mudo do teu corpo.
Falámos de amor.


Luís Filipe Castro Mendes, Modos de Música







VERSOS QUASE TRISTES



Novembro de 2005




Trago no sangue o mistério
daquele resto de estrada
que não andei...

E era talvez ali
que eu ia ser feliz:

ali
que viriam as Fadas pra contar-me
os contos lindos das Princesas
e de Palácios
e de Florestas
que ficaram por contar;
ali que havia de abrir-se
o tal jardim
com flores que nunca morrem
ou, se morrem, há-de ser
na pujança da frescura
por medo de envelhecer...
Mas não passei além da curva...
O meu alento
já dobrou o joelho desistiu.
E eu sei tão bem que há Glória que me chama
e que tudo que digo aqui, ou faço,
é só arremedar, adivinhar,
o que, pra lá da curva que não passo,
havia de fazer ou de dizer!
E eu sei tão bem
que sem tomar nas mãos a Glória apetecida
me não contento!...

- Por que é que tu és só pressentimento,
minha vida?


Sebastião da Gama, Serra-Mãe







CÃO


Caparica. 9-1-2006




      Cão passageiro, cão estrito,
      cão rasteiro cor de luva amarela,
      apara-lápis, fraldiqueiro,
      cão liquefeito, cão estafado,
      cão de gravata pendente,
      cão de orelhas engomadas,
      de remexido rabo ausente,
      cão ululante, cão coruscante,
      cão magro, tétrico, maldito,
      a desfazer-se num ganido,
      a refazer-se num latido
      cão disparado: cão aqui,
      cão além, e sempre cão.
      Cão marrado, preso a um fio de cheiro,
      cão a esburgar o osso
      essencial do dia a dia,
      cão estouvado de alegria,
      cão formal da poesia,
      cão-soneto de ão-ão martelado,
      cão moído de pancada
      e condoído do dono,
      cão: esfera do sono,
      cão de pura invenção, cão pré-fabricado,
      cão-espelho, cão-cinzeiro, cão-botija,
      cão de olhos que afligem,
      cão-problema...

      Sai depressa, ó cão, deste poema!


      Alexandre O'Neill, Poesias Completas






insólito


Lisboa - 7 -1- 2006







Márcia, querida amiga,
ver os seus versos escondidinhos aqui,
eu não gostava, não.
Estou desculpada? :-)






METAL FUNDENTE








Gostava de explicar-te e de poder
eu próprio compreender
por que momentos houve em que perder-te
era metal fundente como o que disse um poeta
entre nós e as palavras existir

Eu seria as palavras tu os corpos
fundentes de nós dois, pela separação
futura liquefeitos
Era de cada vez como se a vida
também fundisse e o seu metal escorresse
sobre a pele da perda talvez isso
explicasse como o chumbo
da ilusão derrete e nos liberta
até desse momento em que tememos
nada mais ter

Mas como poderia
eu amar-te e achar-te já de mais
sentir estando tu tão perto ainda
a onda
da ausência contornar-me

O céu em certos dias produzia
o efeito dum espelho em que voltávamos
inversos
ao verão que tu julgaras
então igual à vida e era apenas
a infância perdida sobre o mar


Gastão Cruz, in Poemas de Gastão Cruz
ditos por Luís Miguel Cintra


- Esteve
voz de Luís Miguel Cintra-








ESTENDAIS



Lisboa. Janeiro de 2006



      Mas são os estendais, à janela
      agitados pelo vento nas abertas da chuva
      que nos trazem a urgência e a constância
      dos corpos, nas mangas pendentes
      de camisas, camisolas ou na roupa

      interior, última margem dos íntimos rios,
      onde os poliesteres aboliram os felpos, os linhos
      as cambraias. Só a cor branca dos lençóis teima
      lá no alto, a abrir velas ao desejo do sol


      Inês Lourenço, daqui






THE COMING OF WISDOM WITH TIME



Lisboa - Janeiro de 2006



    Though leaves are many, the root is one;
    Through all the lying days of my youth
    I swayed my leaves and flowers in the sun;
    Now I may wither into the truth.


    W.B.Yeats, Uma Antologia




                    COM O TEMPO A SABEDORIA


                    Embora muitas sejam as folhas, a raiz é só uma;
                    Ao longo dos enganadores dias da mocidade,
                    Oscilaram ao sol minhas folhas, minhas flores;
                    Agora posso murchar no coração da verdade.


                    W.B.Yeats.Trad.: José Agostinho Baptista







Já nem as aves cantam...



2-1-2006



    Já nem as aves cantam pela maré cheia da tarde.
    À flor da areia
    só o silêncio arde.


    Carlos de Oliveira, Trabalho Poético






TODAS AS NOITES ***




                  todas as noites
                  quero remendar a minha vida
                  e a onda resultante é uma fortaleza
                  ritmo frenético onde um solista
                  tem seu tempo de brilho
                  e vontade
                  de fundir reciclar remendar


                  esta noite
                  com um astro próximo
                  brilhante e ameaçador
                  qual gás de explosão terrorista
                  esta noite
                  vai redimir todas as noites
                  em que quis remendar a minha vida
                  e o resultado foi
                  próximo de zero


                  esta noite
                  será o sótão arrumado
                  (esperou dez anos para que dessem por ele)
                  é, tenho a certeza, a noite da reconciliação
                  a noite em que encontro o bálsamo
                  para continuar e extrair
                  a raiz do que magoa
                  e aspirar os cantos da memória
                  e endireitar livros tombados
                  sobre as personagens inventadas

                  é nesta noite que as verdades por fim descansam
                  exaustas sobre as mentiras
                  inteiras de uma vida


                  2001 - carlos peres feio



*** Com estes versos, que logo me cativaram,
em 14 de Março de 2004, descobri este blog.

Dia especial, o de hoje,
é com eles que quero prestar humílima,
mas especial homenagem ao seu autor,
o querido amigo carlos peres feio

Beijo meu.
Especialíssimo, como não podia deixar de ser.

;=)







Vamos cantar ...



31 de Dezembro de 2005



        Vamos cantar as janeiras
        Vamos cantar as janeiras
        Por esses quintais adentro vamos
        Às raparigas solteiras

        Vamos cantar orvalhadas
        Vamos cantar orvalhadas
        Por esses quintais adentro vamos
        Às raparigas casadas

        Vira o vento e muda a sorte
        Vira o vento e muda a sorte
        Por aqueles olivais perdidos
        Foi-se embora o vento norte

        Muita neve cai na serra
        Muita neve cai na serra
        Só se lembra dos caminhos velhos
        Quem tem saudades da terra

        Quem tem a candeia acesa
        Quem tem a candeia acesa
        Rabanadas pão e vinho novo
        Matava a fome à pobreza

        Já nos cansa esta lonjura
        Já nos cansa esta lonjura
        Só se lembra dos caminhos velhos
        Quem anda à noite à ventura


        Letra e música: José Afonso


-Aqui esteve:
José Afonso, Natal dos Simples
ao vivo - no Coliseu-