A MÃO NO ARADO



Novembro de 2005




Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará

Oh! como é triste envelhecer à porta
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs do verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua

É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã

Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente

Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente


Ruy Belo,
in Poemas de Ruy Belo
ditos por Luís Miguel Cintra


- Esteve:
A Mão no Arado
Voz: Luís Miguel Cintra - pode-se ouvir em http://tecum.multiply.com




19 Comments:

Anonymous Anónimo said...

triste - a comentar posteriormente - triste
abraço cpfeio

12:17 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Como é bonito!

12:32 da manhã  
Blogger wind said...

É tão tristemente belo. Adoro este poeta e a voz do L.M. Sintra ainda dá mais força ao poema:) beijos*****

1:50 da manhã  
Blogger wind said...

Ressalvo *Cintra:)

1:51 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Recebi da queridíssima Márcia Maia, impedida, pelo capricho de umas letrinhas, de aqui escrever:

(ainda eu e as letrinhas....)


Amiga,

vou comentar aqui, again:

ah, como é bonito!

e essa foto casa à perfeição com esse poema meu( que fica sendo seu):

insólito

um lampião
acende o sol
no céu da tarde.

todos os beijos e mais um, querida,

Márcia

8:06 da manhã  
Blogger None said...

O poema, a imagem, a voz, tudo perfeito.

11:09 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

T., permita-me que leve esta fotografia, bela, entre as belas que por aqui vou apreciando.

Excelente a sua proposta para este fim de semana, que lhe desejo muito bom. A.C.S.

12:20 da tarde  
Blogger gato_escaldado said...

"Sagesse" de poeta: administrar a tristeza dos dias de amanhã.

Muito "belo", o poema. Beijos

12:37 da tarde  
Blogger Menina Marota said...

"...É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte dentro..."

Um partilha comovente, mas muito bela!

Grata por ela.

Um abraço carinhoso ;)

3:09 da tarde  
Blogger Poesia Portuguesa said...

Uma partilha fabulosa. Grata por ela.

Um abraço carinhoso ;)

3:10 da tarde  
Blogger Isa Maria said...

Não conhecia mas achei-o cheio de sapiência. BFSemana

7:29 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Procuro «Paradoxes of Prosperity», encontro recanto azul, paradoxal prosperidade de sábado!
Sinceros cumprimentos ao autor.
William P.

2:23 da tarde  
Blogger agua_quente said...

Muito sábio, um pouco triste, belíssimo! E a voz de Luis Miguel Cintra dá-lhe o sentido exacto!
Beijos

7:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Lindíssimo isso. O poeta sabe cuidar das coisas tristes e mágicas com suas palavras... Beijão e ótimo restinho de sábado procê...

9:18 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Soube bem ouvir a declamação deste poema, um grande poema. Beijinhos.

10:35 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Mais, muito mais, do que um BELO poema ; doravante jamais o lerei sem me ecoar a interpretação de Cintra.
Fabulosa a tonalidade da fotografia.
Triste, escrevem, e não é tristeza a «pequenina vida que se concede às unhas»?
Bjs. JP-

3:34 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Parabêns! Linda Fotografia que tirou! Beijinho da Carolina.
P.S.-Foi esperta em ter escolhido essa imagem para a descrição...

9:54 da tarde  
Blogger Unknown said...

'Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente'

Este quase grito do poeta dito por esta voz, transforma-se num duplo prazer...

E porque hoje é domingo, e já está quase no fim, desejo uma óptima semana. Bjs

10:36 da tarde  
Blogger Boo said...

O poema é lindo =)

Neste momento ando a reaprender a poesia, a ler outros poetas e não apenas que estudamos na escola... E é tão bom saber que nessa vastidão que é o mundo poético, encontramos sempre alguém que sente o mesmo que nós e que o expressa de forma tão estrondosa...

Um bom resto de semana =)

Bjnhs

11:14 da tarde  

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