WATER MUSIC. DE HÄNDEL



Jean-Jules Sahmson, La Musique, Georg Friedrich Händel


Sobre o rio descem
cordas e madeiras
a remos de metais.

É como sol nas águas, no arvoredo verde
que as águas reverdece de verdura e sombra.

Crepitam trompas e destilam flautas
na crespa ondulação que as proas tangem
e morre em margens de oboé e bombo,
cadenciando o choque das remadas de ouro.

A brisa flui
serena e fina
em cabeleiras
e em rendas que
ondulam
risonhas e solenes
sobre os bordados esparzidos, prata
que dança e salta enquanto
as barcas se meneiam
na transparência opaca de águas como céu
azul que a tarde por silêncios tece
em majestade eterna e momentânea
dos astros em seu curso.

Habitados só
por deuses e pastores
gerados na saudade
da simples harmonia
contrapontada na invenção da vida,
os planetas pisam
abstractas órbitas
à luz de um sol de que recebem foco.
E as barcas descem temporais o rio
de cujas águas são flutuante forma
da eternidade do destino ignoto.

Com pompas e sorrisos
os instrumentos tocam
virilmente lânguidos
a circunstância de uma festa aquática:
secreta e oculta uma melancolia
dessas grandezas que ordenadas flúem
a remos de metais no efémero perene
de que o eterno faz a sucessão de instantes.

Os últimos acordes como vénias passam.
O sol dardeja sobre as frondes. Tronos
dourados se dissolvem no reflexo de águas
que a música prolonga em gloriosas tardes.

E a glória se dilui de etéreas trompas
que as cordas acompanham sobre os rios
de música tão régia que a existência vive
o acto de pensar na ordem recriada.


Jorge de Sena, Arte de Música



Grata a Salmoura, ab imo corde